terça-feira, 29 de outubro de 2013

MARK BLYTH: «SOU UM FILHO DO ESTADO-PROVIDÊNCIA»

«Nasci em Dundee, Escócia, em 1967 (…) A minha mãe morreu quando eu era muito novo e fiquei ao cuidado da minha avó. Cresci na pobreza (relativa) e por várias vezes fui para a escola com buracos nos sapatos. A minha educação foi, no sentido original da palavra, bastante austera. O rendimento familiar consistia num cheque do Estado, mais concretamente numa pensão de velhice, para além das ajudas ocasionais do meu pai trabalhador manual (…) Sou um filho do Estado-Providência e tenho orgulho neste facto.
«Actualmente, sou professor numa universidade da Ivy League norte-americana [Professor de Economia Política Internacional na Universidade de Brown, uma das universidades de elite dos EUA]. Sou um dos exemplos mais extremos de mobilidade intrageracional. O que fez de mim o homem que sou hoje é aquilo que é agora responsabilizado por ter gerado a crise: o Estado, mais especificamente o Estado-Providência descontrolado, ineficiente e paternalista. Este argumento não passa o teste da intuição. Devido ao Estado-Providência britânico, por muito frágil que fosse por comparação com os seus primos europeus mais generosos, nunca passei fome. A pensão da minha avó e as refeições gratuitas na escola garantiram-no. Tive sempre um tecto, graças à habitação social. As escolas que frequentei eram gratuitas e, na realidade, funcionaram, como escadas de mobilidade para aqueles a quem lotaria genética da vida deu, ao acaso, as capacidades para as subir.
«Por isso, o que me preocupa a um nível profundamente pessoal é que se a austeridade é vista como a única alternativa, então tal não é apenas injusto para a actual geração de trabalhadores que tem de salvar banqueiros, como o meu próximo “eu” pode não vir a existir. A mobilidade social que as sociedades britânica e norte-americana tomaram por adquirida, entre os anos 50 e 80, e que fizeram com que eu e outros como eu fossem possíveis, foi efectivamente interrompida (…) Cortar no Estado-Providência em nome do crescimento e da oportunidade é uma fraude ofensiva. O propósito deste livro é relembrar estes factos e garantir que o futuro não pertence apenas a uma minoria de privilegiados. Francamente, o mundo precisa que mais filhos do Estado-Providência se tornem professores. Isto faz com que o resto se mantenha honesto».

Mark Blyth, «Austerity – The History of a Dangerous Idea», Oxford University Press, 2013

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