terça-feira, 29 de outubro de 2013

MARK BLYTH: «CORTES ORÇAMENTAIS SÃO TOTALMENTE INÚTEIS»

Mark Blyth, professor de Economia Política na Universidade de Brown (EUA) e autor do livro «Austeridade - uma ideia perigosa», já lançado em Portugal, declarou à agência Lusa que os cortes orçamentais anunciados pelo Governo de Passos Coelho não servem para nada.
«[Os cortes orçamentais] são totalmente inúteis. O problema é a forma como os bancos portugueses e a economia portuguesa estão agarrados a um sistema monetário que tem um banco central mas não dispõe de um sistema de colecta de impostos (a nível Europeu) capaz de resolver o problema. Podem esmagar a despesa pública portuguesa até a rebaixarem a “níveis neolíticos”. É como instalar uma instituição bancária na Idade da Pedra. Não resolve o problema. O que estão a fazer é totalmente inútil» - afirmou à agência Lusa o professor Mark Blyth, a propósito dos cortes orçamentais anunciados pelo Governo português.
O economista escocês Mark Blyth, professor de Economia Política no departamento de Ciência Política da Universidade de Brown, em Providence, nos Estados Unidos, é autor do livro «Austeridade - uma ideia perigosa», em que defende que as medidas drásticas não são adequadas para a solução da crise económica. «Quando tudo começou a rebentar, em 2007 e 2008, ficámos a saber tudo sobre as fragilidades das economias do sul da Europa, mas também sobre o elevado nível de endividamento do sistema bancário, que esteve escondido durante mais de uma década» - disse Mark Blyth, sublinhando que as medidas impostas pelos governos dos países expostos à crise não fazem sentido porque apenas servem o sistema bancário em crise.
«São
necessárias políticas de crescimento e emprego, caso contrário a mobilidade laboral vai tentar iludir o problema com medidas económicas que afastam as pessoas com qualificações, as quais, simplesmente, vão abandonar os seus países. E depois, quem paga os impostos?» - questiona Mark Blyth, recordando que, na Irlanda, milhares de pessoas com formação universitária já abandonaram o país.
Para este professor de Economia Política, pressionar o sistema com austeridade «como se esta fosse um estilo de vida» só pode dar maus resultados, e a crise não pode ser solucionada enquanto se tentar resolver, «ao mesmo tempo», uma crise bancária «através de reformas governamentais, porque uma coisa não tem nada que ver com a outra».
«A austeridade é uma forma de deflação voluntária, em que a economia se ajusta através da redução de salários, preços e despesa pública para “restabelecer” a competitividade, que (supostamente) se consegue melhor cortando no Orçamento do Estado, nas dívidas e nos défices» - escreve Mark Blyth no seu livro (página 16), realçando que não se verificam à escala mundial casos que tenham sido solucionados com políticas de austeridade.
«Os poucos casos positivos que conseguimos encontrar explicam-se facilmente pelas desvalorizações da moeda e pelos pactos flexíveis com sindicatos (...) A austeridade trouxe-nos políticas classistas, distúrbios, instabilidade política, mais dívida do que menos, homicídios e guerra» - escreve o autor (páginas 337-338). «Mas também é uma ideia perigosa porque o modo como a austeridade está a ser apresentada, tanto pelos políticos como pela comunicação social -- como o retorno de uma coisa chamada “crise da dívida soberana” supostamente criada pelos Estados que aparentemente “gastaram de mais” - é uma representação fundamentalmente errada dos factos»  - defende Blyth.
Como alternativa, o autor da investigação defende a «repressão financeira» assim como um esforço renovado na colecta de impostos «sobre os que mais ganham», a nível mundial, assim como a procura de riqueza que se encontra «escondida em offshores» e que os Estados «sabem» onde está. «Na verdade, um novo estudo da Tax Justice Network calcula que haja 32 mil biliões de dólares, que é mais duas vezes o total da dívida nacional dos Estados Unidos, escondidos em offshores, sem pagar impostos» - conclui Mark Blyth (página 358) no seu livro «Austeridade - A história de uma ideia perigosa» (editora Quetzal, 416 páginas).

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